dissabte, d’abril 26, 2008



l'historia contada en primera persona


tia adoptada ha dit...

Em 25 de Abril de 1974, eu estava em Lisboa, a frequentar o primeiro ano da Universidade. Nessa altura só havia 3 universidades em Portugal: Lisboa, Coimbra e Porto. Sendo eu do sul, Lisboa era a que ficava mais perto. Em Abril de 74, estava ainda na surpresa de compreender que vivia sob uma ditadura. Embora tivesse participado, desde os 14 anos, num grupo de teatro amador que era dirigido por um médico socialista (ou que como tal se dizia) e onde havia outros socialistas e comunistas; embora frequentasse o cineclube, cuja direcção era sempre composta por gente de esquerda; embora um primo do meu pai estivesse preso por ser comunista (eu só soube da sua existência depois do 25 de Abril); embora o meu pai e um primo meu mais velho escutassem a Rádio Argel com os ouvidos encostados ao aparelho e por várias vezes se dissesse lá em casa «Todo o cuidado é pouco: as paredes têm ouvidos»; embora quando os professores de esquerda, do liceu que eu frequentava (alguns deles amigos de Zeca Afonso) me convidassem para ler textos, sempre que iam fazer conferências ao círculo cultural e o círculo cultural fosse frequentado maioritariamente por gente de esquerda; embora eu tivesse pertencido à comissão de finalistas do liceu, por onde circulavam, secretamente e com capas forradas ou mesmo substituídas, livros de Mao, de Lenine, de Marx, de Hengels, de Trotski; embora o meu nome já constasse da lista negra da PIDE, só quando fui para Lisboa percebi o que era viver sob uma ditadura. Só em Lisboa percebi o que era não ter liberdade de expressão. Explico-me mal, creio. Pelo que disse até agora, poderia parecer que no sul, sul, havia liberdade de expressão e em Lisboa não. Ao contrário: Fora das grandes cidades a censura era de tal forma que nos cegava e nós nem entendíamos que ela existia – simplesmente porque não conhecíamos outra forma de estar na vida. Só em silêncio e obediência. Em medo permanente de um ser omnipresente, omnipotente, invisível. Em Lisboa assisti a estudantes que começavam a falar, antes de o professor chegar ao anfiteatro, e vi os «gorilas» pegarem neles e espancarem-nos. Em Lisboa assisti a cargas policiais sobre estudantes desarmados, porque estavam reunidos e fugi da polícia, por ter praticado o «crime» de estar na faculdade num dia em que houve uma RGA (Reunião Geral de Alunos). Depois li as notícias completamente deturpadas. Em Março, dera-se o primeiro estremeção. Houvera uma tentativa de golpe de estado. A partir daí, o caminho entre a zona onde eu vivia e a faculdade estava «enfeitado de polícias» aí de 30 em 30 metros. À volta do campus havia uma mata. E a caminho da faculdade lá passávamos pelo carro da tinta e pela carrinha com os cães. O carro da tinta era uma técnica «muito eficaz»: Não matava, mas marcava e a malta podia ser apanhada mesmo já longe do local da concentração. À entrada na faculdade, éramos «apalpadas» e «apalpados» por um funcionário (certamente da PIDE), para ver se levávamos propaganda «subversiva». Mas mesmo assim ela passava. Eu ia lê-la para a casa de banho – mas mesmo assim a medo e só depois de ter olhado para todo o lado, para ver se havia algum buraquinho por onde pudessem estar a espreitar-me.
Quando vim a casa, nas férias da Páscoa, disse à minha mãe que «a coisa estava por um fio; e disse-o a uma amiga da minha mãe, senhora não politizada, que, assistindo ao 25 de Abril pouco mais de um mês após eu ter feito tão grave afirmação, passou a consultar-me, qual oráculo. Achava ela que, se eu tinha «previsto» o 25 de Abril, conseguia prever tudo o mais! É preciso ter-se vivido na província e ter-se vivido no meio universitário, nesse período, para perceber como é assustadoramente simples manter o povo na ignorância. A situação tendia a agravar-se quando se era do sexo feminino.
Eu tinha família em Lisboa, mas moravam no Restelo, que ficava muito longe do campus universitário ( foi a desculpa que arranjei para não ficar lá). Fui para um «lar universitário» que era gerido por freiras. Nessa altura, eu já era ateia mas a fama (merecida) de ser lá que serviam as melhores refeições, levou-me a escolhê-lo. E elas aceitaram-me por eu ter tias que moravam no Restelo – O Restelo era o bairro mais caro de Lisboa! Se ainda acreditasse que somos todos iguais aos olhos de deus, fiquei com a certeza de que o não éramos aos olhos daquelas freiras. O lar tinha outra vantagem: pertencia a uma ordem que geria também um excelente lar masculino. Nesse, havia salão de baile e sala de projecção de filmes. Volta e meia faziam lá festas; nós éramos convidadas e, nesses dias, tínhamos autorização para chegar mais tarde!!! Em tempos normais, a entrada era às 22h, durante a semana e às 24h ao fim-de-semana. Naturalmente, nem todas queríamos ir às festas do lar masculino ( só as que lá tinham namorados ou lá queriam arranjar um); mas combinávamos solidariamente uma hora, encontrávamo-nos na rua perpendicular à do lar, as que iam contavam, rapidamente, como tinha sido a festa, e entrávamos todas ao mesmo tempo, como se tivéssemos estado todas juntas!...
O meu quarto, que partilhava com mais duas amigas, era o único em que havia uma «telefonia». No dia 25 de Abril, acordei com a telefonia aos berros «Aqui, posto de comandos das forças armadas…». Uma colega que saíra mais cedo ouvira uns boatos na rua e voltou a correr para o lar; sabendo que nós tínhamos um rádio, entrou de rompante no quarto, ligou o aparelho no máximo e assim nos acordou com a voz militar. A madre superior disse que dentro de uma hora fecharia a porta e não entrava nem saía mais ninguém. E que a comida ia passar a ser racionada. Eu saí à pressa, para ir gastar todo o dinheiro da mesada de Maio em tabaco, conservas e bolachas! Aproveitei para telefonar para casa (no lar só havia um telefone e a fila para o usar era já muito grande). Disse que não se preocupassem, que as notícias pareciam alarmantes mas que estava tudo calmo. E voltei carregada com as bolachas, os pacotes de SG filtro e as conservas de atum. A madre fechou a porta. A partir desse momento, só tínhamos notícias através de amigos que nos jogavam jornais para os balcões das janelas, ou que no-las iam gritando, da rua. Já não tenho ideia de quantos jornais saíram nesse dia, mas volta e meia lá aparecia um com mais umas folhitas.
No dia seguinte, tudo voltou à normalidade, no lar. Mas eu gastara todo o dinheiro que levara para extras. Quando me perguntavam se queria ir ao cinema, abria o armário onde guardara as conservas, o tabaco, as bolachas e dizia: «O meu filme é este». E não me atrevia a pedir mais dinheiro para casa – eu tinha dito ao telefone que estava tudo calmo; se explicasse que a madre ameaçara racionar a comida, na próxima vez, se a houvesse, não acreditariam em mim. Até que uma colega que ficou a estudar até mais tarde e a quem se acabou o tabaco e atacou a fome, me foi propor, a meio da noite, a venda de um maço de tabaco e de um pacote de bolachas. E foi assim que lá voltei a ir ao cinema – sempre que algumas faziam directas, vinham ao tabaco e às bolachas…
Mas já saltei a parte mais importante: antes de voltar a ir ao cinema, fui à primeira manifestação livre do 1º de Maio. Indescritível. Nem em filme se pode mostrar o que foi. Ainda hoje me arrepio, quando me lembro de gente a chorar e a rir ao mesmo tempo, de milhares e milhares de pessoas – portugueses e delegações vindas de todo o mundo – unidos na mesma alegria, na mesma esperança.
Foi bonita a festa, pá…
Depois, depois foi um longo percurso de desmandos, vitórias e exageros cuja história praticamente ainda nem se começou a fazer.
Mas só é possível eu estar a escrever isto e só ouso enviar, porque houve um 25 de Abril!
Viva a Liberdade!


26 / abril / 2008 00:20

Etiquetes de comentaris:

9 Comments:

Blogger luí said...

fantàstic !!
gràcies per deixarme-ho ficar aqui.

26 d’abril del 2008, a les 1:57  
Blogger uf! said...

por o divulgares, gràcies!
:-)
a foto foi bem escolhida :-)

26 d’abril del 2008, a les 2:16  
Blogger luí said...

es un sitio tan especial,
não é?

26 d’abril del 2008, a les 10:17  
Anonymous Anònim said...

quando tiver tempo,vou lêr este texto tãããããão comprido!!!!!!!!!

luzzzzz

26 d’abril del 2008, a les 14:07  
Blogger uf! said...

A igreja do carmo foi destruída pelo terramoto de 1775 e uma boa parte do convento também. Não foi restaurada, não sei porquê, mas penso que foi uma boa ideia deixá-la assim. Uma parte que restou do convento foi transformada em dependência militar: o Quartel do Carmo, no qual se refugiou o Presidente do Conselho do Estado Novo, Marcelo Caetano, no 25 de Abril. Foi também lá que Marcelo Caetano se rendeu.
Beijos

26 d’abril del 2008, a les 16:33  
Anonymous Anònim said...

leelo Luz , que vale la pena
e agora
voy a cantar.
até

26 d’abril del 2008, a les 17:19  
Blogger uf! said...

já te disse que encontrei, em Lisboa, CDs de Luar na nubre?

26 d’abril del 2008, a les 23:37  
Blogger luí said...

A mi me gustaba muchisimo la voz de Rosa.
Embora eu como adoro o portuga pios tambem gosto da Sara.
Solo que estas músicas, por vezes são demasiado saudosas pra mim ..
;-)

27 d’abril del 2008, a les 1:46  
Blogger uf! said...

pois, o cd que comprei foi, precisamente, o «saudade»
:-))

27 d’abril del 2008, a les 10:48  

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